quarta-feira, 19 de maio de 2010

A promulgação do Presidente

Meu Caro António Tavares

Ainda a propósito do teu texto "O não veto do presidente"

A questão é: o que diferencia, ou deve diferenciar, um presidente que é eleito do lado contrário à esquerda? A postura? O carácter? O estilo? A aparência? A seriedade? A competência? Ou também as ideias e a atitude? Admito que para muitos portugueses, quem sabe se a maioria, as ideias e a atitude pesem menos no momento da opção e do voto. Consciencializaram, mesmo não querendo saber de pormenores constitucionais, que o presidente não governa e manda pouco logo o que dele esperam é simplesmente que os represente com dignidade e seja uma voz calma e serena em tempos difíceis. O governo é o pai, a assembleia os tios e os primos que vêm almoçar ao domingo e o presidente é o avô. Não mais do que o avô. E qual é o papel do avô? Ou melhor dizendo qual é o papel que esperamos do avô? Que defenda os netos, que chame a atenção do pai, apelando à sua benevolência, que transmita serenidade e bom senso. O avô é muito importante nas nossas vidas, mas simplesmente não decide. A parte má da decisão fica para o pai e às vezes para os tios e para os primos, cuja presença na casa implicou ou influenciou uma determinada decisão.

Ora o que fez Cavaco na noite de 2ª feira? Fez o papel do avô que tem opinião, que a emite, mas que não decide. Fez talvez o que a maioria dele esperava. Aliás Cavaco Silva nestas questões não deixa créditos por mãos alheias. É um profissional e ponderou seguramente o que política e eleitoralmente seria melhor para si próprio. Ele sabe que o povo de "direita" vota há muito pelo mal menor e que em momentos decisivos prefere excluir a escolher ou até a não votar. Afinal, não o esqueçamos, foi ele um dos grandes beneficiários desta modalidade de voto, traduzida naquilo que muitos designam por "voto útil".

Acontece meu caro António que apesar de também eu já ter votado "útil", nomeadamente em Cavaco, nas presidenciais, não deixo de pertencer à minoria. Sempre estive, no que não faz de mim um ser perfeito, do lado da minoria. Assumo-o! O único grupo maioritário, esmagadoramente maioritário, a que pertenço é o BENFICA, no mais sou um minoritário militante. E é como minoritário que pergunto:

- faz sentido mantermos um sistema semi-presidencial no qual o presidente fala, mas não age (apesar da força que Cavaco Silva demonstrou nessa questão crucial, que incomodava imenso os portugueses, do estatuto dos Açores e neste caso contra a quase unanimidade da Assembleia)?
- faz sentido termos eleições presidenciais com campanhas politizadas, dramatizadas, entre esquerda e direita, se em questões de princípio não há diferenças? Imagina que Alegre era o presidente. Que faria ele de diferente nesta matéria do casamento gay? (Já sei omitiria o facto de só 6 países no mundo terem casamento para pessoas do mesmo sexo)
- faz sentido a minoria, à qual pertenço, continuar a votar em Cavaco. Porquê? Esta pergunta já tem que se lhe diga, reconheço-o. Se há eleições onde a minoria conta, e de que maneira, é precisamente nas presidenciais (foi por uma unha negra que Cavaco ganhou na 1ª volta...). Duvido que aconteça, mas se essa minoria, a que não gostou da decisão de Cavaco, avançasse com um candidato presidencial muitas novidades poderiam surgir na política portuguesa.

O não veto chama-se Promulgação. E é dela, meu caro António, que a história falará.

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