Leio no Expresso que o governo não tenciona devolver o dinheiro cobrado aos contribuintes, mesmo que o Tribunal Constitucional venha a pronunciar-se pela inconstitucionalidade das normas que prevêem a retroactividade do IRS.
A confirmar-se a notícia trata-se de uma decisão grave demonstrando que o governo se considera acima da lei e da própria Constituição. Vale a pena reflectir sobre isto, mesmo que (repito o que tenho escrito)a maioria não se interesse pela substância e prefira o infinito do acessório.
Admitamos que o TC declara inconstitucionais as normas objecto de fiscalização (o que francamente duvido que aconteça. Contam-se pelos dedos das mãos as decisões do Tribunal Constitucional - desde 1982 - contrárias às posições da maioria política. Ou não fosse o TC um Tribunal político), mas admitamos que isso sucede. Qual a consequência normal num Estado de Direito? Simplesmente que os impostos cobrados ao abrigo de uma lei inconstitucional sejam devolvidos aos contribuintes. O que lemos no Expresso? Que isso não se vai passar assim! Ou seja, o governo declara antes da "sentença" que não a cumprirá se ela for contra a sua vontade e os seus interesses.
Pergunto? Vivemos num Estado de Direito? Imaginemos que os cidadãos passam a actuar da mesma forma. O Tribunal decide e os cidadãos não cumprem. Que exemplo nos dá o governo? É o exemplo do não cumprimento, o exemplo da rebelião, o exemplo do não respeito às autoridades, às instituições e órgãos do Estado. E é ainda o exemplo do regresso à lei da força, por substituição à força da lei. Chegámos ao fundo de todos os fundos e chegámos aqui com a conivência e a cumplicidade de muitos.
Ao dizer: NÃO CUMPRO a decisão do Tribunal se ela não me convier, o governo desrespeita o Presidente da República, pressiona por antecipação os juízes do TC e diz aos cidadãos algo que julgávamos banido da prática política: L`État c`est moi.
Para quem quer comemorar os 100 anos da República estamos conversados.
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