segunda-feira, 19 de abril de 2010

NOVA CONSTITUIÇÃO - artigo de MANUEL MONTEIRO no Diário de Notícias de 19/04/2010

As políticas devem ser sempre a consequência de uma Política e de um projecto global que se tem para a sociedade. Quando as políticas não resultam de uma orientação ampla a política perde identidade, transforma – se em acção casuística e limita – se a responder ao imediato. Faltando uma Ideia para o país, uma noção para o papel do Estado e uma estratégia para a actividade do governo, os políticos olham a parte como se fosse o todo e o todo como simples soma das partes. É neste contexto que assume toda a importância o que se pensa sobre uma Constituição, seja ela um corpo de princípios que garante direitos e limita poderes ou um conjunto de normas que prescreve fins e define funções para o Estado. Querer uma Constituição mais neutra ou, ao contrário, totalmente interveniente na comunidade, não é indiferente ao modelo de sociedade em que se acredita e pelo qual se quer fazer política.

Considerar assim que o debate sobre a Constituição portuguesa é irrelevante, demonstra desconhecimento ou simples má fé. Nós não temos uma Constituição isenta, apesar da carga ideológica dela retirada nas revisões de 1982 e de 1989. A nossa Constituição é um programa de governo permanente que condiciona, limita, impede e proíbe a escolha de novos caminhos. Em Portugal, nas questões essenciais o voto popular é um mero ritual para garantir um rotativismo espúrio, porque na realidade quem perde nas urnas tem sempre na Constituição uma arma de arremesso para dificultar a vida a quem ganha. A prova mais evidente da relevância da Constituição está precisamente no facto da esquerda mais retrógrada e dos situacionistas, não quererem a sua reforma. Eles sabem que nenhum projecto sustentável de mudança pode ser ambicionado, se o principal factor de bloqueio político continuar exactamente na mesma. Por isso quando atacam a oportuna proposta de Passos Coelho e a sua determinação em alterar o texto da Lei fundamental estão apenas a tentar garantir a sua sobrevivência.

Não cabe à Constituição definir projectos para o futuro, tão pouco dar orientações ideológicas quanto à natureza dos impostos, ao modelo de representação eleitoral ou à forma de organização da economia. À Constituição deve competir o estabelecimento de regras claras, quanto ao relacionamento entre os poderes constituídos e a sociedade. A esta tem de sobrar autonomia e liberdade para se estruturar no plano económico e social, de acordo com a vontade expressa nos actos eleitorais. A democracia só será plena se não for previamente impositiva quanto ao modo, quanto à forma e quanto aos objectivos a alcançar pelos governos. O que se espera de uma Constituição é que garanta direitos, limite poderes e permita aos concorrentes políticos sem restrições a concretização das suas ideias, se o povo as tiver sufragado. Mudar a Constituição é, como bem sustenta o novo líder do PSD, uma missão que tem tanto de urgente, como de imprescindível à construção de um novo Estado. Está em causa libertar a sociedade e assumir que há democracia para lá do que a Constituição define, prescreve e impõe como regra democrática. Assumir esta linha de pensamento pressupõe dizer que os direitos e as liberdades dos cidadãos, num Estado verdadeiramente democrático, não existem só porque a Constituição os prevê e estipula. E pressupõe ainda permitir que as maiorias de governo não sejam eternas prisioneiras das maiorias constituintes. A soberania da Constituição será tão mais respeitada, quanto mais ampla for a soberania do parlamento porque é esta a mais fiel e actual interprete da decisão eleitoral. Quem desconfia e teme a liberdade do parlamento, e das maiorias nele formadas, desconfia do povo e inspira – se nas correntes que julgando as massas brutas e incultas, necessitam de quem as eduque e conduza.

Desconheço a orientação que Passos Coelho dará à sua proposta de mudança da Constituição. Admito até que fique muito aquém do que penso, mas o seu passo merece o meu apoio. É um princípio, um bom princípio, para o novo Portugal do séc. XXI.

Manuel Monteiro

3 comentários:

  1. A revisão constitucional é da maior importancia.
    No entanto o país está mal e não é por causa da Constituição que temos.
    E não é necessária uma revisão constitucional para se mudar o que não funciona.
    Portanto dizer que a revisão da Constituição é a prioridade nesta altura é um bocadinho ridiculo...

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  2. Acho muito engraçado que haja agora um conjunto de opinadores a dizer que a Constituição não é um problema prioritário. Sempre que se pretende atacar problemas de fundo, logo engrossa o coro e a orquestra, dos que acham que isso não é fundamental. Mas, por outro lado, já acham essencial que se discuta se um apeadeiro deve ou não encerrar e debater outras minudências. A Constituição é de onde tudo parte, logo é determinante, saber-se o que queremos dela. Aliás, o que verdadeiramente se devia fazer, era conceber uma Constituição nova, que não fosse condicionada por quaisquer espartilhos ou preconceitos. Uma nova Constituição devia ser obrigatoriamente desenhada para ter que ser aprovada por unanimidade. Só assim se teria um conjunto de regras de funcionamento que serviriam a todos os partidos políticos e se acabaria com a tentação de tudo querer regular. Uma Constituição que fosse o máximo, ou mínimo, denominador comum. Por isso, a iniciativa de Pedro Passos Coelho é de louvar e de apoiar, independentemente, dos resultados que venha a ter e que já se percepcionam...

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  3. Diogo Pacheco de Amorim20 de abril de 2010 às 19:35

    Como a Constituição só permite governar à Esquerda, se eu fosse um homem de esquerda também acharia que não havia nada a mudar na Constituição... o país é como um barco cujo leme só vira à esquerda... cada vez que há um escolho, esquerda... e como à esquerda cada vez à mais escolhos, não tarda o barco naufraga...

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