Em tempos de crise, que deveriam ser de contenção, como explicar a compra sem concurso público daquilo que já existe e está sem utilização?
GNR ofereceu blindados mas Governo quer comprar novos - Diário de Notícias
A despesa de cinco milhões em material de ordem pública carece de visto do Tribunal de Contas, cujos prazos podem impedir que chegue a tempo da Cimeira da NATO.
A GNR tem disponíveis 13 veículos blindados, que usou no Iraque e que estão agora parados nas garagens da guarda, que podiam ser emprestados à PSP para a operação de segurança da Cimeira da NATO. No entanto, conforme noticiou ontem o DN, o Ministério da Administração Interna (MAI) autorizou a compra de seis veículos novos para a PSP, bem como de diverso outro material e equipamento de ordem pública, no total de cinco milhões de euros. Na altura da missão do Iraque, o MAI comprou 20 blindados e neste momento só tem seis empenhados em Timor e na Bósnia.
"A guarda manifestou disponibilidade para emprestar os blindados, com ou sem guarnição, mas ao que sabemos, não recebeu resposta", disse ao DN o presidente da Associação Nacional dos Oficiais da Guarda, que representa os comandantes desta força de segurança.
Em comunicado, a associação, "estranha" esta opção e questiona a eficácia da "coordenação" do gabinete do secretário-geral do Sistema de Segurança Interna (SGSSI). "Qual o papel do SGSSI para pôr mão nesta 'competição" institucional a que vimos assistindo em detrimento do superior interesse nacional? Porque é que a tutela, que sabe ter meios disponíveis nas Forças e Serviços de Segurança, se permite gastar cinco milhões de forma inqualificável, ao mesmo tempo que impõe severas restrições orçamentais que afectam as capacidades operacionais e diminuem a qualidade do serviço prestado aos cidadãos?", interrogam os oficiais.
Na sequência da notícia do DN, que dava conta da autorização de a PSP adquirir vário equipamento de ordem pública para a operação de segurança da Cimeira da NATO, por ajuste directo, o MAI esclareceu que será "feito um procedimento concursal com consulta a várias entidades". Mas, segundo o professor da Universidade de Coimbra, Pedro Gonçalves, especialista em Direito Administrativo, tal fórmula "significa, na mesma, ajuste directo, quer se trate de convite a uma só ou a mais empresas".
Mas, a menos de dois meses da Cimeira da NATO, para a qual o equipamento pretendido pela PSP é essencial para garantir a ordem pública, há ainda necessidade de pedir um visto prévio ao Tribunal de Contas (TC). Segundo explicou ao DN a porta-voz oficial do TC, este visto é necessário "para despesas superiores a 350 mil euros" e o Tribunal "tem 30 dias para responder, embora possam ainda ser pedidos esclarecimentos". Em relação a possíveis "excepções" a estes procedimentos que legitimem uma maior celeridade, esta fonte oficial diz que "depende da situação em concreto" e que "só perante o processo se poderá avaliar a sua legalidade".
Uma das justificações para o ajuste directo e para que o visto possa ser pedido a posteriori é a "urgência imperiosa" para a aquisição do material (ver caixa). Mas é o próprio MAI que coloca de parte essa possível justificação quando diz, no seu comunicado, que esta compra "estava programada há vários meses". O porta-voz oficial do ministro da Administração Interna, Rui Pereira, justifica esta contradição pelo facto de apenas "no passado dia 16 de Setembro o Ministério das Finanças" ter autorizado "a utilização deste saldo".
Por outro lado, causou estranheza na PSP o facto de o MAI ter declarado que a aquisição do material não se destinava apenas à PSP, mas às "forças de segurança" em geral". Estranheza porque a reivindicação para a compra do equipamento esteve também na mesa de negociações entre os sindicatos e o MAI, na semana passada. Segundo Paulo Rodrigues, da Associação Sindical de Profissionais de Polícia, o maior sindicato da PSP, "os sindicatos fizeram ver ao ministério que era fundamental a aquisição deste equipamento para assegurar a operação com o profissionalismo que este evento exige". Paulo Rodrigues lembra que "o mundo vai ter os olhos postos em Lisboa e a polícia tem de estar à altura". Sublinha ainda que "este equipamento não se esgota na Cimeira e que vai servir sempre para a PSP utilizar na segurança dos cidadãos em geral". Aplaude a direcção da PSP por ter "conseguido este investimento" e lembra que as "últimas compras deste material foram no Euro 2004".
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