«Creio que o que os portugueses hoje esperam dos partidos políticos e dos principais responsáveis políticos é que se entendam sobre os efetivos problemas do país e que deixem para mais tarde divergências ideológicas que, do nosso ponto de vista, são desajustadas neste momento»
A frase acima é da autoria de Luís Amado no último fim-de-semana e insere-se na linha de outras do tipo abundantemente proferidas por dirigentes partidários.
Por exemplo, recordo-me de há tempos um deputado do CDS ter dito o seguinte: "Nestas questões que são de defesa da soberania e dignidade do Estado e, simultaneamente, se prendem com o combate ao terrorismo, não queremos fazer combate político-partidário".
E de Manuela Ferreira Leite em plena campanha eleitoral para as últimas eleições legislativas ter afirmado - a propósito do interesse e oportunidade em definir um novo regime jurídico para arguidos e acusados, portanto ainda não condenados, nem absolvidos, em processos-crime, que pretendam ser candidatos a cargos políticos, designadamente à Assembleia da República - que não estava disponível para discutir assuntos sérios em período de campanha eleitoral.
Este é o género de declarações que amiúde são proferidas pelos políticos quando querem furtar-se a discutir determinadas matérias.
Não será, pois, seguramente a última vez que um dirigente partidário, qualquer que seja o quadrante em que se insere, assumirá este tipo de discurso, nomeadamente, quando se sustenta igualmente que há matérias que pela sua importância (normalmente é invocado o superior interesse nacional e a dignidade do Estado) não devem ser objecto de debate entre partidos políticos.
Mas, para além do estafado artifício utilizado, importa reflectir sobre a substância deste tipo de afirmações. O que se pretenderá efectivamente com elas? É que o seu verdadeiro alcance conduz-nos à questão de saber para que servem as campanhas eleitorais, as eleições e os partidos.
Significa que os assuntos nobres e sérios não são para serem tratados pelos partidos?
Mas num regime multipartidário, são então para serem abordados por quem?
Será que os que expressam estas opiniões, defendem que as campanhas e a actuação dos partidos fora delas apenas se devem confinar às visitas a feiras e mercados nos quais profusamente se distribuem beijos, abraços, apertos de mão, sacos de plástico, canetas, e sei lá mais o quê?
E que aos partidos apenas devem estar reservadas as questões menores, as que não se prendam com assuntos de Estado e que não encerrem divergências ideológicas?
Se assim é…não deverão depois surpreender-se com a elevada taxa de abstenção com que os eleitores os distinguem, nem manifestar preocupação com o que essa atitude significa.
Para que servem os partidos, senão para expressarem as opiniões sobre a sua visão do país, as linhas orientadoras da legislação que promoverão na Assembleia da República, as medidas que tomarão, obviamente diferentes uns dos outros?
Para que serve um partido político senão para afirmar a sua perspectiva sobre os vários assuntos que dizem respeito à governação do país, nos seus diversos planos, designadamente o Orçamento de Estado?
Como é possível achar que um partido não se deve pronunciar sobre assuntos relevantes, e, ao mesmo tempo, intervir sobre aspectos de importância bem mais reduzida?
Os dirigentes partidários deviam compreender que ao sustentarem que as questões sérias e de Estado não são para serem tratadas pelos partidos políticos estão a passar um atestado de menoridade a eles próprios, só contribuindo assim para aumentar a descredibilização dos partidos políticos, da política e do regime democrático.
E, claro, para aumentar a abstenção...
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