domingo, 28 de fevereiro de 2010

CATÁSTROFES NATURAIS: É PRECISO PREVENI-LAS - artigo de MANUEL MONTEIRO no SOL de 27/02/2010

E agora? Enterram – se os mortos e alimentam – se os vivos”.
Marquês de Pombal, após o terramoto de 1755

Todos sabemos que as catástrofes naturais são imprevisíveis, incontroláveis e irrecusáveis. Ninguém lhes pode virar as costas, não se dominam e é impossível prevê – las com exactidão e rigor. No entanto, culpar a natureza e a sua fúria por tudo o que de grave sucede, significa muitas vezes irresponsabilidade e indiferença perante a acção e a omissão criminosa dos poderes públicos. A construção desregulada, tal como o surgimento de pontes, de túneis, de estradas e de viadutos em locais onde não deveriam estar, ajuda a entender a dimensão de várias tragédias.

Agora foi a Madeira onde a impunidade nesta matéria anda há anos à solta, mas amanhã poderá ser Lisboa ou qualquer outra cidade. Na capital temos bairros inteiros com casas que se amontoam, com ruas sem espaço para a circulação eficiente de um carro de bombeiros, com edifícios sem qualquer protecção contra sismos, com leitos de rios e ribeiros tapados e furados sem critério. O que conta é fazer, é inaugurar, é construir a qualquer preço. Conluiados muitas vezes com quem constrói, os responsáveis pelo poder comportam – se como autênticos predadores do território e semeiam mais tarde o horror, a tristeza, a perda de vidas e de bens. A prevenção e a segurança não constam dos seus códigos e perante a calamidade têm todos o mesmo discurso. Pedem solidariedade, falam de inter – ajuda, e dizem não ser a hora de fazer política. Numa atitude covarde são incapazes de assumir falhas e escondem – se na azáfama do dia seguinte.

Alguns, mesmo que tenham sido autores ou cúmplices dos erros, até as mãos esfregam diante do dinheiro que podem ainda ganhar com a reconstrução. Tal como os criminosos de guerra, estes criminosos em tempo de paz também espalham a destruição e a morte, mas ao contrário dos primeiros gozam de impunidade. Com efeito não é de política que se trata é de respeito pelos cidadãos, de humanismo, de defesa da vida. E estas questões são bem mais relevantes do que qualquer luta pelo poder.

Se um autarca ou um governante, regional ou nacional, despreza a vida de homens e de mulheres, de crianças e de idosos, permitindo e incentivando obras que colocam em perigo a segurança, ele é simplesmente um inimigo da humanidade. Não tem desculpa, porque não há palavras que calem ou sosseguem o desespero. Não pode sequer esconder – se atrás do desconhecimento, evocar a boa fé ou justificar – se com a brutalidade da natureza. Há técnicos reputados que todos os dias avisam para a possibilidade de calamidades naturais e para a necessidade de se prevenirem danos irreparáveis. Todavia, os seus avisos ou são classificados de catastrofistas ou são ignorados. Quem decide não ouve. Em vez de corrigir, de substituir, de investir na recuperação das cidades e de as preparar para os gritos da natureza, os responsáveis festejam a obra mal feita. Se justiça houvesse o Ministério Público conduzi – los – ia ao banco dos réus, como não existe resta que a nossa ira os condene.

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